quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Abuso sexual no Pará: cultura do obsceno ou reflexo do abandono?


Crimes sexuais contra a criança e o adolescente persistem no estado. Além de acelerar processos, investigação aberta em CPI da Assembleia Legislativa do Estado motiva aumento nas denúncias e ajuda a ampliar debate sobre formas de erradicar abuso.

Por Guto Lobato
(Matéria originalmente produzida para a edição de junho da revista Via Pará, porém não publicada devido ao fechamento da publicação)

Nos últimos meses, parlamentares do Legislativo paraense têm voltado olhares para um assunto polêmico e que sempre figurou, mesmo que de forma velada, em rodas de discussão e investigações de todas as esferas do estado. Com a instauração da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Pedofilia em janeiro passado na Assembleia Legislativa (Alepa), as denúncias de abuso sexual contra crianças e adolescentes voltam a ter os holofotes voltados para si. Fato inédito e oportuno, que ajuda autoridades públicas a traçar com mais precisão o mapa deste tipo de crime no Pará – estado que está em quarto no ranking de denúncias, segundo dados do Governo Federal.

Com mais de 1,2 mil denúncias registradas de 2003 até janeiro deste ano no telefone Disque 100 – número em que podem ser relatadas violências de toda ordem, desde o abuso até o tráfico de pessoas e a exploração sexual comercial –, o Pará figura como um dos estados mais problemáticos no que tange à garantia de direitos da criança e do adolescente. Não é diferente com os casos de abuso sexual. Além das dificuldades comuns a vários estados brasileiros, como a falta de acesso à informação, a ausência de políticas públicas e o “abafamento” dos casos, ainda há um fator cultural que agrava a questão no Pará: a relativa aceitação e facilidade em ocultar a prática, principalmente no interior.

O fato de uma CPI local ter sido instaurada (há uma no Senado em curso deste o ano passado) já trouxe resultados. Em pouco mais de três meses, mais de 1,1 mil denúncias foram recolhidas pela Alepa, entre casos já protocolados na Justiça, mas que não iam adiante, e outros cuja divulgação foi motivada pela presença constante do assunto na mídia. Da mesma forma, o Centro Integrado de Atenção a Vítimas de Violência Sexual (Pró-Paz), do Governo do Estado, tem registrado, desde janeiro deste ano, de 8 a 10 denúncias por dia, contra a média de 5 casos/dia dos anos anteriores.

Denúncias envolvendo figuras públicas, como o deputado estadual Luiz Seffer (sem partido) e o irmão da governadora Ana Júlia Carepa (PT), João Carepa, têm de fato encorajado vítimas de abuso a recorrer às entidades responsáveis e expor seus dramas de forma mais intensa. A expectativa na Assembleia Legislativa é que até 9 mil denúncias tenham seus trâmites acelerados até o final da CPI. Mas, em meio a tantos esforços, fica a pergunta: até quando o abuso sexual persistirá assombrando famílias no Pará? Quais fatores dificultam sua erradicação e como revertê-los?

A reportagem ouviu especialistas para conhecer a fundo a questão. Há divergências entre posições do governo e de entidades não-governamentais, mas os consensos prevalecem. Um deles é a natureza silenciosa do crime de abuso sexual. Estima-se que mais de 70% dos casos ocorram dentro de casa, praticados por familiares do sexo masculino contra crianças e adolescentes – 85% destes do sexo feminino – de todos os estratos socioeconômicos. A grande maioria das vítimas sequer chega a denunciar, já que represálias e ameaças por parte do abusador são constantes. Muitos casos, portanto, ficam restritos ao ambiente doméstico, com o conhecimento – e até consentimento – dos demais membros da família.

A ausência de políticas públicas também dificulta o combate ao abuso sexual, principalmente no interior. Por conta disso, as estatísticas registradas no Disque 100 e em órgãos como o Pró-Paz (que só possui sede em Belém) estão permanentemente desatualizadas, geralmente pondo à frente da frequência de denúncias municípios como Belém, Ananindeua, Marituba e Benevides – todos pertencentes à Região Metropolitana da capital. Mas eles não representam a totalidade da faixa de abrangência do crime, que também atinge regiões distantes da capital como a do Marajó e do Baixo Amazonas. “Por isso dizemos que os dados registrados não são reais. Eles indicariam que a maior incidência de abusos é na área da capital, por exemplo, mas isso, sabe-se, não é verdade. Há pontos em que o Estado nem sempre se faz presente, e a falta de entidades responsáveis e informação sobre a prática resultam em um subregistro que só dificulta sua erradicação”, pondera a assistente social Eugênia Fonseca, coordenadora do Programa Pró-Paz.

A sensação de impunidade que resiste às campanhas nacionais de erradicação do abuso sexual possui raízes históricas e culturais no Pará. Em algumas regiões, a falta de informação e de acesso a Conselhos Tutelares e entidades de proteção aos direitos da infância e juventude faz com que muitas famílias convivam com o crime sem fazer maior alarde. A assistente social Karina Gama, pertencente ao projeto Jepiara, do Centro de Defesa da Criança e do Adolescente/Movimento República de Emaús (Cedeca/Emaús), conta ter vivenciado situações deste tipo enquanto trabalhava em um programa de erradicação do abuso no interior do estado.

Pode parecer perturbador, mas Karina chegou a atender famílias que não possuíam discernimento sobre a gravidade do crime praticado contra suas crianças e jovens, vendo-os como “normais”. “No interior, a falta de informação gera percepções perturbadoras sobre a violência sexual. Há casos em que o pai abusa da filha e não só ele, como a própria mãe desta criança, veem a situação como normal”, relata. “Nos casos em que a mãe entende a gravidade desta prática, ainda há a chance de ela não denunciá-la por medo de represálias ou por conta da dependência financeira em relação ao marido”, completa.

A mesma opinião é compartilhada pelo diretor de cidadania e direitos humanos da Secretaria de Estado de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh) Luiz Romano. “Não é difícil você encontrar casos de abuso sexual em que o pai diga que queria ser o primeiro a fazer sexo com a filha de dez anos. Isso resulta da falta de informação sobre a gravidade do crime de abuso sexual, assim como da existência de uma certa tolerância cultural em relação à prática”, avalia. “Junte-se isso à imensa rede da exploração sexual e tráfico de crianças e adolescentes que existe no Pará, e vemos que há um problema de natureza ética e socioeconômica que resulta no total desrespeito aos direitos da infância e juventude previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). São questões relacionadas, que precisam ser combatidas pela raiz”.

Pedofilia não é crime, e sim transtorno de comportamento

Ainda há muita confusão na terminologia aplicada aos crimes de abuso sexual. A própria CPI da Pedofilia não deveria ser denominada como tal, já que “pedofilia” é um termo associado a um desvio sexual pela Organização Mundial de Saúde (OMS). Criminosa é a prática de ato lascivo/libidinoso ou de corrupção de menores, que infringe o Código Penal (artigos 213, 217, 218, 227, 228, 233 e 234) e o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, artigos 232, 241, 232 e 243) – geralmente o abuso é enquadrado na Justiça como estupro ou atentado violento ao pudor. Além disso, nem todo abusador é pedófilo por excelência: em muitos casos, o crime de abuso é cometido mais pela vulnerabilidade da vítima que pela atração sexual primária – leia-se preferencial – do abusador por crianças e adolescentes.

As características que diferenciam o abusador convencional do pedófilo transparecem, inclusive, em sua forma de abordar as vítimas, conforme explica a coordenadora do Pró-Paz Eugênia Fonseca. “O comportamento do pedófilo é muitas vezes diferente daquele que caracteriza quem comete abuso sexual intrafamiliar, por exemplo. O pedófilo manifesta seu interesse pela criança de forma diferente, busca se aproximar dela e conquistar a confiança de seus familiares, muitas vezes equiparando-se à sua vítima em hábitos e preferências, enquanto que o abusador possui traços agressivos e opressores, ameaçando a vítima frequentemente”, explica a assistente social.

Para a medicina forense, a pedofilia está incluída como um “transtorno de personalidade e de comportamento”, segundo o psiquiatra e psicanalista Edilberto Maia. Os fatores que influem na configuração do distúrbio – que, eventualmente, pode definir o comportamento de acusados de abuso sexual – podem ser vários, desde problemas na atividade cerebral do indivíduo até o ambiente em que ele estrutura sua personalidade. “Hoje, com a evolução da psiquiatria biológica, sabe-se que existe uma região no cérebro responsável pela afetividade, e algumas pessoas nascem com um defeito. É como se ela estivesse desconectada”, explica. “Outro fator é o ambiente. Quem foi espancado, sofreu agressões graves, foi violentado ou abusado sexualmente tem mais chance de, na vida adulta, vir a se tornar pedófilo”, completa.

Segundo ele, ainda, os números que associam a maioria dos abusos contra a criança e o adolescente ao ambiente doméstico correspondem à natureza psicossocial do distúrbio. “A verdade é que a família tende a vivenciar casos de pedofilia se houver algum desajuste na estrutura de personalidade de um desses pais ou de ambos. Geralmente, homens molestam sexualmente seus próprios filhos pré-púberes e, surgindo a oportunidade, também seduzirão outras crianças fora do espaço familiar”, encerra o psiquiatra.

Pará é o quarto estado em denúncias por habitante no Brasil

Há sete anos sob a responsabilidade da Secretaria Especial dos Direitos Humanos (SEDH), da Presidência da República, com o apoio da Petrobras e do Centro de Referência, Estudos e Ações Sobre Crianças e Adolescentes (Cecria), o Disque Denúncia tem contabilizado um crescimento vertiginoso no número de notificações de violência em solo brasileiro. De 2003 até janeiro deste ano, a média de casos relatados por dia no Brasil subiu de 12 para 89 (ano de 2008), o que indica os efeitos de uma extensa campanha de combate à violência contra a infância e juventude. Das 87 mil denúncias encaminhadas pelo serviço ao longo de sete anos, 31% são de violência sexual, dos quais, por sua vez, 57% são de abuso sexual. Logo atrás, vêm os casos de exploração sexual (antes denominada “prostituição infantil”), com cerca de 40%.

Os dados que existem sobre o Pará denotam igual aumento. Apesar de não figurar entre os líderes regionais no número absoluto de denúncias, o estado fica em quarto lugar no ranking das denúncias por grupo de 100 mil habitantes no território federal, assim como a região Norte em geral (veja quadro). Vale lembrar que, dois anos atrás, ele era o décimo segundo estado nas mesmas estatísticas. Segundo o diretor de cidadania e direitos humanos da Sejudh Luiz Romano, isto não indica um aumento nas ocorrências de abuso, e sim a maior conscientização por parte de quem o testemunha. “Hoje, as pessoas têm menos medo de denunciar a violência sexual. Mesmo um vizinho já tem coragem de ligar ao ver um pai abusar de sua filha. Para nós, portanto, ver o Pará no topo das denúncias pode ser um bom sinal, um sinal de conscientização”, acredita.

O mapa da violência contra crianças e adolescentes no Brasil

- A cada dia, 165 crianças e adolescentes são vítimas de violência sexual no Brasil – a maioria dentro de casa. Dados do Disque Denúncia apontam mais de 87 mil denúncias entre 2003 e 2009; 31% delas são de violência de natureza sexual. Destas, 57% se referem a abusos sexuais e 40% à exploração sexual;

- Os estados que lideram em denúncias são, à exceção do Maranhão (MA), situados nas regiões Norte e Centro-Oeste, líderes em número de denúncias para cada 100 mil habitantes;

- As regiões que registram a maioria dos casos por grupo de habitantes são o Centro-Oeste (65 denúncias para cada 100 mil habitantes) e o Norte (59 denúncias/100 mil hab.). A região que tem o menor número proporcional de denúncias por habitante é o Sudeste (36 por 100 mil hab.);

Estados que mais denunciam no Brasil
Fonte: Secretaria Especial de Direitos Humanos/ Presidência da República

1 - Distrito Federal (DF)
2 - Mato Grosso do Sul (MS)
3 - Maranhão (MA)
4 - Pará (PA)
5 - Amazonas (AM)

Denúncias nas regiões brasileiras
Fonte: Secretaria Especial de Direitos Humanos/ Presidência da República

1. CENTRO-OESTE: 65,42 denúncias/ 100 mil habitantes
2. NORTE: 59,43 denúncias/ 100 mil habitantes
3. NORDESTE: 56,33 denúncias/ 100 mil habitantes
4. SUL: 43,51 denúncias/ 100 mil habitantes
5. SUDESTE: 36,23 denúncias/ 100 mil habitantes

- No Pará, o tipo de violência mais frequente ainda é a violência física e psicológica, com 2.580 casos registrados entre 2003 e 2009. O abuso sexual figura em terceiro lugar, com 1.215 denúncias;

Tipos de denúncias no Pará (2003-2009):
Fonte: Secretaria Estadual de Justiça e Direitos Humanos (Sejudh)

1. VIOLÊNCIA FÍSICA E PSICOLÓGICA – 2.580 casos
2. NEGLIGÊNCIA – 2.422 casos
3. ABUSO SEXUAL – 1.215 casos
4. EXPLORAÇÃO SEXUAL COMERCIAL – 844 casos
5. TRÁFICO DE CRIANÇAS E ADOLESCENTES – 22 casos
6. PORNOGRAFIA – 19 casos

Entrevista: Arnaldo Jordy


“Vamos manter a cobrança sobre os órgãos de Justiça competentes”

Com mais de 30 anos de carreira política no Pará – boa parte deles na Câmara Municipal dos Vereadores de Belém – e atualmente na Assembleia Legislativa do Estado (Alepa), o deputado estadual Arnaldo Jordy (PPS) é relator da CPI da Pedofilia e figura recorrente na Casa durante as sessões dedicadas à investigação de casos de abuso contra crianças e adolescentes. Em entrevista exclusiva, o parlamentar fala dos principais resultados que se pretende alcançar com a CPI, além de comemorar o aumento nas denúncias após sua instauração e criticar a falta de políticas públicas de proteção social. Quanto ao prazo para o fim das investigações – que inicialmente durariam 120 dias, mas já foram prorrogadas –, Jordy é enfático: “Se ainda faltar algum detalhe, algum caso que seja, vamos pedir mais tempo”:

O que vocês desejam com a CPI da Pedofilia na Alepa? Acelerar os processos já protocolados na Justiça ou incentivar a denúncia de novos casos de abuso sexual?

Não há foco principal. Estamos trabalhando em cima de três metas: primeiro, mostrar à sociedade a escala, o tamanho e a gravidade deste tipo de crime. Muitas vezes, não temos a menor ideia do quanto ele é comum e, às vezes, aceito. Só em Belém, por exemplo, nos últimos cinco anos, há uma média de 900 casos/ano, e isso porque esse é o crime mais dificil de ser denunciado, até pelo constrangimento social e moral – não tem testemunha e, dificilmente, tem flagrante em caso de abuso sexual. O Estado não consegue combatê-lo sem o consenso e colaboração da sociedade civil, é preciso que haja a denúncia anônima, a repercussão.

Além disso, a CPI tem o sentido de cobrar da Polícia Civil, do Poder Judiciário, dos Ministérios Públicos e quem mais lidar com estas denúncias um grau maior de celeridade, porque o que hoje se vê é uma letargia, quase que uma conivência com os autores dos abusos. Quanto maior o grau de influência das figuras envolvidas, mais difícil e lento é o processo de apuração. Há quem compre delegado e juiz, infelizmente isso acontece e tem de acabar.

E por terceiro e último, queremos concluir essa CPI com a certeza de que o Estado se aperfeiçoou na proteção de vítimas de violência sexual. É inaceitável, por exemplo, que o Pró-Paz, principal programa do Governo do Estado, só funcione de segunda a sexta, até as 19h, se a maioria dos crimes ocorre à noite. O Pró-Paz não tem nenhuma sede no interior do Estado. Ao menos nos municípios-pólos deveria ter. Também não temos uma delegacia especializada em abuso sexual de crianças e adolescentes no Pará. É difícil conseguir algo sem que o Estado atue de forma mais enérgica no sistema de proteção.

Vocês têm saído da capital e acompanhado os casos do interior?

Temos feito viagens frequentemente, e essa é uma meta para que a CPI tenha o âmbito que merece. Já fomos a Altamira, Itaituba, Breves e Portel, mas a intenção é ir a todos os municípios paraenses onde houver denúncias, contemplando pelo menos os municípios-pólos.

Quantas denúncias vão ser investigadas durante a CPI?

É difícil precisar, até porque todo dia chega denúncia aqui na Assembleia, mas creio que vamos chegar ao final dessa CPI com entre 8 e 9 mil casos registrados e analisados – todos referentes aos últimos anos.

As denúncias envolvendo figuras públicas ajudaram a conferir visibilidade à questão do abuso sexual. Mas o tratamento dado a elas será igual, também, na hora de investigar?

Ainda é muito comum haver a sensação de impunidade nos processos judiciais, mas nós não podemos aceitar que o criminoso de invasão seja condenado sumariamente e o cara que tem carro do ano, conta bancária fora do Brasil e mandato político fique sem pagar pelo crime que cometeu. Não é porque o cara é irmão da governadora ou membro da Assembleia Legislativa que a CPI vai ter qualquer tipo de conivência. A ordem, aqui, é investigar e, se necessário, exigir a punição sumária de todos.

E no que tem resultado a CPI até agora?

Como eu disse: todo dia tem gente vindo denunciar casos a nós. A visibilidade da CPI está trazendo resultados ótimos. A gente agradece de antemão aos órgãos de imprensa, à sociedade e às entidades pelo apoio integral, muita gente tem se encorajado por conta do foco que o tema ganhou em nosso Estado. O caso do irmão da governadora (João Carepa) foi assim. A menina que foi abusada estava no culto, aí, por acaso, o pastor resolveu falar sobre o assunto. No retorno para casa, a criança foi pensando naquilo e nos assuntos que ouvia falar todo dia: a CPI, as acusações, as investigações. Ela chegou em casa, contou pra mãe que estava sendo abusada e o caso veio para nós.

Vocês pretendem ver todos os culpados punidos? Até quando?

Olha, isso não depende da Assembleia Legislativa, depende do Poder Judiciário. O resultado da CPI vai ser encaminhado ao Senado [onde também transcorre uma CPI da Pedofilia], aos Ministérios Públicos, ao Judiciário como um todo e também às ONGs e sociedades ligadas ao combate do abuso sexual contra crianças e adolescentes. Daí em diante, fica a cargo da Justiça avaliar cada situação. Mas, mesmo após o término da CPI, vamos manter a cobrança sobre os órgãos de Justiça competentes, até para que estes casos não “desapareçam” sem deixar rastros. A intenção é que todos tenham um desfecho justo.

Por quanto tempo ainda haverá CPI da Pedofilia na Assembleia Legislativa?

O quanto sentirmos que ela precisa ser prorrogada, vamos levá-la adiante. A CPI, inicialmente, foi criada com o prazo de 120 dias, mas vamos programar por mais 60, no mínimo, e se ainda faltar algum detalhe, algum caso que seja, vamos pedir mais tempo.

Alguns casos marcantes – e chocantes

- O abuso sexual contra jovens tem tradição nas manchetes da imprensa internacional. Casos envolvendo figuras públicas e anônimas e famílias das mais variadas origens e classes socioeconômicas chocam a opinião pública por seus requintes de crueldade – e, também, longevidade, principalmente quando o crime ocorre dentro de casa. Anos (às vezes décadas) de clausura, violência física, estupros, ameaças e até mesmo filhos gerados de relações incestuosas – como foi o recente caso do austríaco Josef Fritzl – compõem o quadro perturbador em que se encaixam alguns casos recentes. Conheça alguns deles:

• Índia, 19 de março de 2009

Em março passado, um empresário indiano do ramo automobilístico foi preso em Mumbai, Índia, sob a acusação de ter abusado da filha durante nove anos seguidos, de 2000 até o início deste ano.

A polícia local apurou que o abusador, cuja identidade não foi revelada, teria praticado tais atos após receber conselhos de um amigo dotado de “poderes espirituais” – a prática de relações sexuais com a garota, que tinha 14 anos ao início dos abusos, iria ajudar o empresário a se reerguer.

Descobriu-se, posteriormente, que a outra filha do acusado foi violentada pelo tal “curandeiro” pelo mesmo motivo. A esposa do empresário também acabou atrás das grandes, sob a suspeita de ter sido cúmplice.

• Itália, 28 de março de 2009

A polícia italiana prendeu, em março, após meses de investigações, os vendedores Michele Mongelli, 64 anos, e seu filho Giuseppe, 41, acusados de abusar sexualmente da filha e irmã durante nada menos que 25 anos.

Desde os nove anos de idade da filha, Michele – apelidado de “monstro da Itália” pela imprensa local – a violentou e manteve sob condições de escravidão e abandono. Giuseppe, o filho, além de estuprar a própria irmã, fez o mesmo com os filhos de 6, 8, 12 e 20 anos.

Os dois abusadores foram processados por estupro, abuso familiar e atos obscenos praticados em público – isso porque, disse a polícia, alguns dos estupros ocorreram dentro de um carro.

• Áustria, 19 de março de 2009


Foi nesta data, pouco mais de onze meses após o estouro do caso, que o eletricista aposentado austríaco Josef Fritzl (foto), 73 anos, foi condenado à prisão perpétua por um tribunal da cidade de Sankt Pölten, após decisão unânime do júri.

A barbaridade que cometeu não deixava dúvidas sobre o assunto: durante 24 anos, ele manteve a própria filha, Elisabeth, presa em um cubículo no porão de sua casa, em Amstetten, leste da Áustria, simulando seu desaparecimento à esposa Rosemarie, aos vizinhos e até à polícia.

Durante todo o período, ele a estuprou. Sete filhos nasceram das relações incestuosas. Um bebê, morto logo após o nascimento, teve o corpo eliminado por Fritzl. Seu caso resultou nas acusações de estupro, incesto, coação grave, privação de liberdade e homicídio por negligência – todas acatadas pelo júri. Apesar de a vítima ter 18 anos à época em que foi enclausurada, o caso gerou clamor popular pelos requintes de crueldade.

• Colômbia, 30 de março de 2009


O colombiano Arcebio Alvarez (foto) foi preso pela polícia na região de Mariquita, Colômbia, sob a acusação de ter violado a filha durante 30 anos seguidos. A denúncia foi feita pela própria vítima, Alba Nidia Alvarez, agora com 35 e mãe de oito crianças entre um e 19 anos – todas resultado das relações incestuosas mantidas à força com o pai. Outras três morreram logo após o nascimento.

Segundo a imprensa local, Arcebio já abusava sexualmente de três de seus “filhos-netos” quando Alba decidiu denunciá-lo. Ela foi apoiada e encorajada por um pastor evangélico. Agora, a vítima e seus filhos estão sob proteção judicial e aguardam o julgamento do “monstro de Mariquita” – que chegou ao ponto de falar, em juízo, que Alba e ele mantiveram relações “consentidas”.

• Argentina, 21 de maio de 2008

Eleuterio Soria, de 74 anos, residente na Argentina, foi condenado no ano passado a 16 anos de prisão por ter abusado sexualmente da filha, segundo a Justiça do país. A vítima foi violada dos 11 aos 22 anos em um quarto no qual passou todo o tempo presa, dentro de sua própria casa.

Duas crianças nasceram do incesto e têm, hoje, 7 e 14 anos. A filha do abusador está com 28 anos de idade e vive ao lado de um companheiro, com quem tem dois filhos. Apesar da semelhança com o caso do austríaco Josef Fritzl, a acusação que foi imposta ao abusador argentino foi amena: “abuso sexual agravado”. Por isso a pena de apenas 16 anos.

• Brasil, 20 de março de 2002


À noite deste dia, o “Programa do Ratinho”, do canal SBT, exibiu imagens que chocaram o País. Logo em seguida, o caso migrou à TV Globo e ao Ministério Público, pondo na mídia nacional o nome de um médico pediatra de ascendência ucraniana dono de carreira estável no Brasil: Eugênio Chipkevitch (foto), então com 47 anos e diretor do Instituto Paulista de Adolescência, em São Paulo. Sua acusação: abusar sexualmente de mais de 40 meninos de 8 a 17 anos – todos clientes de sua clínica.

Um técnico de empresa telefônica encontrou 35 fitas de vídeo no lixo, assistiu-as e as divulgou. Em todas, Chipkevitch aparece manipulando sexualmente os corpos dos garotos dentro da clínica após sedá-los, sob o pretexto de aplicar vacinas.

Ao assistir ao “Ratinho”, uma mãe reconheceu o abusador no vídeo e correu atrás da polícia. O médico foi preso em casa no dia seguinte. Passou alguns meses sob investigação e, ao final, foi condenado pela Justiça a 114 anos de prisão em regime fechado – pena cumprida até hoje, em um presídio paulista.

Uma curiosidade chamou ainda mais a atenção das autoridades: antes de ser identificado como pedófilo, Eugênio havia escrito o livro "Adolescência: Os segredos que seus filhos não contam". A co-autora, Vera Scognamiglio, ficou chocada e cancelou o lançamento do livro na hora. “Jamais pensei que ele poderia estar envolvido em algo assim”, garantiu.

Denuncie

Se você deseja denunciar casos de abuso sexual contra crianças e adolescentes, é só entrar em contato gratuitamente – e a qualquer hora – pelo Disque Denúncia 100, de qualquer lugar do Brasil, ou pelo número 55-61-3212-8400, caso esteja no exterior. E-mails podem ser enviados ao endereço disquedenuncia@sedh.gov.br. No Pará, denúncias podem ser feitas ao Programa Pró-Paz pelos telefones (91) 3241-5058 ou 4009-2268, de segunda a sexta-feira, das 8h às 19h.

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